por Chico Marques
O Santos Jazz Festival chega ao seu sexto ano bem diferente do que era nos anos anteriores.
Para esta edição, dedicada às divas do jazz e à diversidade sexual, quase não há atrações de música instrumental programadas -- apenas o Igor Willcox 4tet e a Traditional Jazz Band.
O outrora ponto alto do Festival -- o show-âncora com algum instrumentista de expressão nacional ao lado da versátil Orquestra Sinfônica de Santos -- foi excluído da programação pelo segundo ano consecutivo, o que é uma pena, já que as performances de Hermeto Paschoal, Egberto Gismonti, César Camargo Mariano e Rosa Passos com nossa brava Sinfônica nas quatro primeiras edições do Santos Jazz Festival foram memoráveis e até inesquecíveis.
Dessa vez, shows em lugares fechados só mesmo o da noite de abertura do Festival, que acontece quinta à noite no Teatro do SESC. Todas as demais apresentações acontecerão num único palco ao ar livre nos Arcos do Valongo, no Centro Histórico de Santos, com acesso gratuito. Como não há previsão de chuva, e nem de frio intenso, até meados da próxima semana, o Festival não corre o menor risco de ser prejudicado pela meteorologia.
Prevalece a tendência esboçada na edição do ano passado de fazer do Santos Jazz Festival um evento sem atrações de primeira grandeza, cada vez menos jazzístico, cada vez mais popular, e com uma programação pouco relevante em termos artísticos mas de apelo imediato perante o grande público.
Dentro desse contexto não muito animador para os amantes do jazz e da música instrumental, JAZZ JIVE conseguiu selecionar para seus leitores cinco apresentações agendadas para o Santos Jazz Festival deste ano que podem surpreender de forma bastante positiva.
Vamos a elas:
ARI KUMAR BLUES BAND
(Sexta 22/07 - 18 horas - gratis)
Ari Kumar tem 37 anos de idade e nasceu em Mumbai, na Índia. Estudou Ciências Tecnológicas na San Jose State University, no Norte da California, e logo arrumou emprego na Adobe, em Silicon Valley. Descobriu o blues ainda na Índia, em discos de seus pais, que eram bem ecléticos em termos musicais, e começou a tocar harmônica meio que da brincadeira. Só foi mergulhar de cabeça na musicalidade dos negros americanos quando descobriu o mapa da mina para os bares de blues de Oakland e Berkeley, cidades próximas a San Francisco. De canja em canja, acabou virando uma figura conhecida na Bay Area, e pouco a pouco deixou que isso se transformasse numa segunda profissão. Comanda uma banda brilhante, que o ajudou a forjar dois discos muito engenhosos com uma fusão musical east-west menos experimental e mais palatável ao grande público do que aquela tentada pela lendária Butterfield Blues Band nos Anos 60. Resta saber se os músicos de blues brasileiros que acompanham Ari Kumar nesses shows pelo Brasil vão embarcar com ele nessa aventura musical multicultural, ou se vão simplesmente montar um repertório de blues básicos sem contraindicações, mas bem menos aventuresco que praticado pela Ari Kumar Blues Band americana original. Aconteça o que acontecer, vale uma conferida.
THIAGO ESPÍRITO SANTO + SÍLVIA GOES + ALBA SANTOS
(Sábado 29/07 - 18:30 horas - gratis)
Thiago Espírito Santo é um felizardo. Criado numa família musical, aprendeu com o pai a nunca ter preconceito com modalidades musicais supostamente "inferiores" e sempre viajar pelos mais diversos fronts musicais. Da mãe -- a musicóloga, arranjadora, compositora e pianista Sílvia Goes -- ele tratou de absorver a sabedoria e a bagagem necessárias para dar solidez e consistência a suas aventuras musicais. Depois de muitos anos de convívio musical constante, mãe e filho agora podem se deixar guiar pelo instinto sem medo de pisar em falso, e passeiam pelos mais diversos ritmos brasileiros como se estivessem na sala de casa. De samba em samba, de choro em choro, de bolero em bolero, Sílvia e Thiago saem mapeando descompromissadamente os sons do Brasil, e os mesclando com toques de jazz -- sempre com a ajuda da cantora espanhola Alba Santos, que imprime um toque latino inusitado a toda essa mistura musical. Um show que promete ser, no mínimo, muito agradável.
IGOR WILLCOX 4TET
(Sábado 29/07 - 20 horas - gratis)
Baterista e compositor, Igor Willcox já pode ser considerado um veterano, pois vem de uma grande família musical santista e toca desde menino tanto em grupos de jazz fusion quanto em bandas de jazz tradicional e de artistas pop, como Guilherme Arantes. Nesse show à frente de seu quarteto -- Clayton Sousa no saxofone, Vini Morales nos teclados e Glécio Nascimento no baixo --, Igor apresenta suas próprias composições que estão em seu primeiro álbum solo, o recém-lançado "#1", que chega muito elogiado pela crítica nacional e internacional, com destaque especial no conceituadíssimo portal jazzístico All About Jazz. Igor Willcox faz jazz-fusion de alto gabarito, sem a menor contra-indicação. Não perca esse show.
JEZ CONDADO BLUES BAND
(Domingo 30/07 - 17 horas - gratis)
Jez Condado é uma bela cantora, baixista e guitarrista de Mendoza, Argentina, que fez carreira em Buenos Aires em bandas como The Good Girls e The Hoochie Coochie Girls entre 2006 e 2014. Estudou guitarra, baixo e canto na Escola de Blues de Buenos Aires entre 2008 e 2011. Sabe-se lá o que a trouxe a São Carlos, no interior de São Paulo, em 2015, mas o Brasil agradece o fato dela ter decidido fixar residência por aqui. Seu segundo disco solo, "Natural", só com composições próprias em espanhol, português e inglês, é surpreendente de tão bom. Aos 32 anos de idade, Jez Condado está vindo a Santos pela primeira vez, e quem gosta de blues não pode deixar de estar lá para vê-la e ouvi-la. Eu diria inclusive que ela merece receber a Chave da Cidade, para voltar sempre que quiser.
ROBERTO SION + ANAÍ ROSA
(Domingo 30/07 - 18:30 horas - gratis)
Saxofonista, flautista, clarinetista, arranjador, compositor, maestro e professor, Roberto Sion tem sido ao longo dos últimos 40 anos um gigante da música instrumental brasileira. Estudou na Berklee School Of Music em Boston nos Anos 70 e teve como professor o craque absoluto do sax alto Lee Konitz. Foi integrante do lendário grupo instrumental Pau Brasil nos Anos 80. E hoje é regente da gloriosa Orquestra Jovem Tom Jobim, entre muitas atividades musicais educativas que desenvolve. O repertório que ele e a cantora Anaí Rosa prepararam para a apresentação deste domingo é bem eclético, bem despojado e deve agradar a todos os que estão com saudades desse grande santista nos palcos desta cidade.
Comments
Post a Comment