James Farm é um quarteto de jazz acústico formado pelo famoso saxofonista (tenor e soprano Joshua Redman, mais Aaron Parks (piano), Matt Penman (contra-baixo) e Eric Harland (bateria). Todos são músicos altamente respeitados na cena jazzística. Apesar de Joshua Redman ser a grande estrela do grupo, faz questão de manter o perfil baixo e se comporta como apenas mais um integrante da banda, que existe há cinco anos.
Aos 46 anos de idade, 25 de carreira, e com quase um metro e noventa de altura, Joshua é um gigante em todos os sentidos -- no palco, nos discos, no meio musical e em sua vida pessoal. Filho do saxofonista Dewey Redman (1931-2006), que contribuiu para alguns dos melhores trabalhos de Ornette Coleman e Keith Jarrett, com o fôlego com que prolonga o tempo musical e sua esperteza nos fraseados rápidos, Joshua também parece um exemplo clássico de talento hereditário. Foi muito influenciado por ele, em todos os sentidos.
Voltando ao James Farm: se engana redondamente quem acha estar diante de um quarteto de jazz tradicional. James Farm usa como ponto de partida um bebop bem contemporâneo, e sai fundindo isso com canções pop, baladas country e algumas variações de folk music americana e européia. Detalhe: tudo isso sempre recheado de muito improviso musical providenciado por seus talentosíssimos quatro integrantes. O resultado disso tudo é surpreendente. E pode ser conferido nos dois LPs que a banda lançou até agora, pela prestigiosa Nonesuch Records: "James Farm" (2011) e "City Folk" (2014)
O James Farm veio ao Brasil pela primeira vez dois anos atrás, para se figurar no BMW Jazz Festival, e agora está de volta para uma apresentação na edição deste ano do Noblu Jazz Festival, no SESC Pompéia, além de uma apresentação adicional no Teatro do SESC-Santos.
Todos os quatro amam a música brasileira de forma entusiasmada.
Já passaram por aqui diversas vezes, e fazem questão de afirmar que nossa música os encanta.
JAZZ JIVE: Uma pergunta inevitável: vocês gostam de tocar no Brasil?
Joshua Redman: Eu adoro vir aqui, o público é sempre fantástico e emocionado, é um lugar muito musical.
Matt Penman: É incrível estar aqui. Há tanta alegria na cultura brasileira e quando as pessoas escutam música, querem experimentar esta alegria. Você vê os sorrisos e quer fazer com que eles sintam cada vez mais isso. Porque todos gostam de alegria na música.
JAZZ JIVE: Outra pergunta inevitável: o que vocês conhecem da música brasileira?
Joshua Redman: Conheço alguma coisa da Bossa Nova, amo João Gilberto, Milton Nascimento, Djavan. A música brasileira é tão maravilhosa e variada, cheia de facetas. Há muitos gêneros diferentes dentro da música brasileira e todos são, de alguma maneira, muito bonitos. Existe uma fragilidade muito bonita em toda esta musicalidade.
Matt Penman: Sou um grande fã de Djavan e Milton Nascimento. Recentemente descobri o cantor e violonista Guinga e me apaixonei por sua música. Adoraria tocar com ele ou com Milton Nascimento. Vocês têm muita sorte, há muitos artistas de qualidade do Brasil.
Eric Harland: Eu amo Ivan Lins, ele definitivamente é um dos meus favoritos. Mas há diversos grandes artistas brasileiros.
Aaron Parks: Ouço muita música brasileira desde sempre. Comecei a ouvir música brasileira provavelmente na mesma época em que comecei a ouvir jazz. Egberto Gismonti, Hermeto Pascoal foram grandes influências quando comecei a tocar e a lista continua. Adoro a música brasileira e sua harmonia é incrível. Muitas coisas da música brasileira podem ser consideradas jazz, sinto que elas estão próximas em muitas maneiras.
JAZZ JIVE: Muitos artistas pop estã incorporando traços de jazz em seus trabalhos. O que vocês acham disso?
Matt Penman: Os artistas estão ultrapassando os gêneros. Gênero hoje é uma maneira de identificar suas influências musicais, mas isso não significa que é a única coisa que faça. Joss Stone, por exemplo, é uma artista pop com influências de jazz. Nós somos um grupo de jazz que ouve muita música pop. Afinal, é tudo apenas música. Podemos dizer que esteticamente escolhemos um caminho, mas acredito que os músicos mais interessantes são bastante abertos para transitar entre os gêneros.
Eric Harland: Músicos e artistas estão provando que amam todo tipo de música. Gostamos da liberdade de um ritmo, a estrutura de outro, o groove do outro ou a harmonia de um outro. E quando tentamos reunir tudo isso, fica mais difícil classificar em gêneros.
JAZZ JIVE: Joshua, essa aqui é para você. Muita gente o compara a Dewey Redman e vê em você uma das principais características dele: um músico de vanguarda e do free jazz mas sempre ligado às estruturas tradicionais. É um caso de "tal pai, tal filho"?
Joshua Redman: Não cresci ao lado do meu pai. Meus únicos contatos com ele, na verdade, foram ouvindo os discos dele. Ele vivia em Nova York e eu cresci em Berkeley, na California. Eu só o via quando ele ia para a minha cidade, o que era, talvez, uma vez por ano. Fui muito influenciado, mas descrever a música dele e a minha não é uma coisa em que eu seja bom. Acho que o som dele é um dos mais bonitos sons de sax tenor na história. O calor e a alma com que ele tocava, a maneira como podia criar um poder tão grande só por meio da sonoridade... Há um profundo sentimento vindo do blues em toda a música. Meu pai também trabalhou em muitos estilos. E isso é uma coisa que eu também gosto.
JAZZ JIVE: Mas vocês tocaram juntos, e chegaram a gravar dois discos juntos. Como foi tocar e gravar com ele?
Joshua Redman: Foi ótimo! Uma excelente oportunidade de aprender ao lado de um mestre, de meu herói. E também uma grande oportunidade de conhecê-lo, porque eu não o conhecia realmente bem.
JAZZ JIVE: Como vocês definem a sonoridade do James Farm?
Matt Penman: Criamos o James Farm como uma cooperativa, em vez de ser "meu" grupo ou o grupo deste ou daquele músico. Estamos muito animados com a música que estamos fazendo. Definitivamente é jazz, é improvisado. Ele vem da influência da linguagem do jazz, mas a música tem um monte de outras influências, de estilos. Em termos de grooves, climas e texturas, tem um pouco mais da sensibilidade do rock do que alguns dos outros projetos dos quais participei. E também na estrutura das músicas, na maneira com que integramos a improvisação.
JAZZ JIVE: Tocando em um grupo como o James Farm, vocês percebem um novo público ou um estilo em formação?
Matt Penman: O jazz está continuamente mudando e se desenvolvendo. Esta é uma forma de arte que, de certa forma, é sempre nova porque está sempre se reinventando; pela improvisação, ele está sempre fresco, vital, é sempre uma música do presente. Seria excelente que houvesse mais jovens ouvindo jazz.
Aaron Parks: Demograficamente, o público típico de um show de jazz é mais velho. Mas acho que é uma questão de dar chance às pessoas de ouvirem esta música.
Joshua Redman: Há certas formas de arte que requerem um pouco mais de paciência e também um pouco mais de experiência do ouvinte. O jazz com certeza é uma delas, é uma música à qual é preciso continuar se expondo, ouvindo de novo.
JAZZ JIVE: Hoje há grandes músicos de jazz que jamais pisaram em Nova York, Nova Orleans ou Chicago. Como vocês vêem esse fenômeno de desterritorialização? O que há de bom e de ruim nisso?
Joshua Redman: Acho que é ótimo, é música mundial, a informação musical viaja tão rápido, é uma revolução tecnologia que a nova geração sofreu. Você não precisa ir até Nova York para ouvir grandes bandas de jazz nova iorquinas, põe na tela da internet e um segundo e ouve. Sim, é uma globalização do jazz que se acelerou muito, eu acho maravilhoso. A internet acelerou tudo. Em geral, acho muito bom. Há mais informação musical acessível instantaneamente para mais músicos.
Matt Penman: Eu já acho que jazz é, em algum nivel, uma música do povo e das comunidades, e que deveria ter mais algum... sentido de conexão com o seu lugar, em um sentido físico. O jazz é a música da cidade, da vila, da vizinhança, as pessoas tocam e ouvem juntas em um local. Eu acho que com todos os avanços na tecnologia, que são maravilhosos e permitem a tráfego de informações, não podemos perder de vista a importância que o jazz tem na existência em espaços físicos, no sentido de agregar pessoas em comunidade, para tocar e ouvir. É importante preservar isso, mesmo no meio de todos os avanços tecnológicos.
Joshua Redman: Tem razão, o excesso de informação também pode gerar uma perda de foco. Lembro que, quando estava crescendo, significava tanto comprar um disco na loja. Você pegava aquele disco, botava para tocar, tinha uma relação física com o disco e a música. E agora tem tanta música – e tudo linka a outra coisa. Então, acho mais difícil as pessoas ouvirem música com foco e atenção, a consequência é ter menos profundidade. Mas acho que os músicos mais sérios e dedicados sabem como usar as ferramentas tecnológicas a seu favor.
JAZZ JIVE: Vocês entendem bossa nova como jazz brasileiro?
Joshua Redman: Não sei muito para poder falar com autoridade, mas nunca a considerei assim. Bossa nova é bossa nova, uma forma de arte por si. Há uma grande relação entre ela e o jazz, sim.
Matt Penman: Alguns dos primeiros compositores da bossa foram influenciados por coisas que estavam acontecendo no jazz. Há muita sobreposição, colaborações históricas como a de Stan Getz e João Gilberto. Mas bossa é um gênero próprio. E todo músico de jazz hoje foi influenciado por ela de alguma forma em termos de harmonias, melodias e ritmos. Ela é parte da nossa linguagem.
JAZZ JIVE: Joshua, uma pergunta para você movida pela minha curiosidade pessoal. No seu blog, alguém perguntou: "Por que a música em vez de advocacia?". A sua resposta foi: "Por que não?". Qual foi a razão da guinada?
Joshua Redman: Quando me mudei para Nova York, me vi de repente com a chance de tocar com alguns dos melhores músicos, tanto com alguns que eram meus heróis como também da geração mais jovem. Então percebi o quanto a música significava para mim, o quanto ela completava o desejo que eu tinha de me expressar e viver de uma maneira que eu não conseguia com outras coisas.
JAZZ JIVE: Para encerrar: dos grupos de jazz atuais, quais vocês acham os mais relevantes em termos musicais e sintonizados artisticamente com vocês?
Eric Harland: Somos todos fãs incondicionais do The Bad Plus, que reinterpreta de Nirvana a Stravinski e mistura de suingue a techno, é altamente cativante. E eles também adoram tocar aqui no Brasil.
JAMES FARM AO VIVO
TEATRO DO SESC-SANTOS
QUINTA
26 DE MARÇO de 2015
21 HORAS
Rua Conselheiro Ribas 136
Telefone: 2378-9800
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